segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A transposição em declínio

Manoel Bomfim Ribeiro

Está se configurando a paralisação das obras da transposição de águas do rio São Francisco para o semiárido brasileiro, fato previsto como soe acontecer com um grande número de obras nesta esquecida região do Brasil. 

Temos atualmente cerca de 40 obras abandonadas no Nordeste, esta será apenas mais uma. Dentre estas citamos algumas: O Projeto Salitre em Juazeiro-BA para irrigar 29.000 hectares, o Canal da Batateira, abandonado pelo tempo, uma vergonha, em Sobradinho-BA, o Platô de Guadalupe para irrigar 14.000 ha no Piauí, o Tabuleiro de Russas para irrigar 11.000 ha no Ceará, a Adutora do Sertão em Alagoas, a Adutora do Oeste em Pernambuco, o Canal da Redenção para irrigar 5.000 ha em Souza na Paraíba e por aí vai. 

Vemos grandes blocos ciclópicos e quilômetros  de canais em concreto abandonados pelos caminhos nas grandes solidões geográficas do Semi-Árido. Tubulões de grandes diâmetros já cobertos pela vegetação e jogados pelas estradas, comportas de grandes barragens arrebentadas como no açude de Ibimirim-PE, que acumula 504 milhões de metros cúbicos de água, extravasando e perdendo a toa, o seu precioso líquido. 

Este açude é maior que o Lago Paranoá de Brasília. Falta de recursos, mudanças de governo, contendas políticas e outras evasivas são fatores que paralisaram este grande rosário de obras.

Se estas 40 obras fossem concluídas irrigariam mais 400.000 hectares de terras ofertando cerca de três milhões de novos empregos e 10 milhões de toneladas de produtos agrícolas por ano, uma grande riqueza para a nossa região.

Estas obras abandonadas atestam a solidez da indústria das secas e a Transposição é a rainha desta indústria. Esta obra vai ser paralisada com mais facilidade que as outras. Ela não resiste a uma travessia administrativa porque é obra desprovida de significado nada, representando para a comunidade nordestina.

Só um grupo político luta por ela. Se um dia fosse concluída, iria levar apenas uma pouca d’água, 2 bilhões/m³ na sua vazão máxima para onde já existem 40 bilhões acumulados, portanto, 5% do já estocado.

Este pequenino volume a ser transportado vai consumir nas suas mega-bombas cerca de 600 MW de energia, quase metade do consumo baiano, nada acrescentando ao grande potencial hídrico do Semi-Árido brasileiro. É levar pedra pro morro.

A paralisação desta obra deverá ser festejada, pois representa um grande lucro, evitando-se mais despesas para o País. 

Necessitamos, sim, de obras complementares nos nossos açudes para distribuir e atomizar suas águas atendendo as populações difusas da região.

Na praça dos Três Poderes, em Brasília, acontece o protesto de todas as classes, dos índios aos sem terra, das professoras aos sem teto, mas nunca se viu o protesto dos sem água, logo água que é vital na sua essencialidade. 

Os olhos de alguns políticos e empreiteiros se voltam agora para a Copa de 14. Estão sendo construídos estádios, aeroportos, rodovias e hotéis numa grande hierarquização de obras. 

Os prazos são rígidos e improrrogáveis, os orçamentos não falham e são generosos, há uma torcida organizada de todo o povo brasileiro e os olhos atentos e curiosos do mundo inteiro. É um complexo de obras que jamais sofrerá solução de continuidade. Haverá jogos em Recife, Natal e Fortaleza, faixa do Semi-Árido.

A Copa está pondo uma pá de cal na Transposição tal é a sua fragilidade como meta de Estado. O projeto, em breve, será abandonado e os escombros de concreto ficarão expostos e eternizados à flor da terra atestando o naufrágio do maior complexo industrial das secas em todos os tempos. As gerações futuras hão de ficar horrorizadas  com a galinha gorda que a nossa geração fazia com o dinheiro do povo.

O Senhor Ministro da Integração Nacional, em reunião promovida pela Carta Capital em 06 de dezembro último, em Salvador, anunciou a pretensão do Governo em construir o Canal Sul para o lado baiano.   

Vamos aguardar sentados e com paciência epistolar enquanto houver vida. 

Fonte: Tribuna da Bahia

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