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Noite histórica. De um lado, no corner direito, os
que são contra as cotas raciais por entender que estas violam o princípio da
isonomia dos cidadãos. Do outro lado, no corner esquerdo, aqueles que defendem
que o sistema de cotas. No meio, a julgar a contenda, dez ministros da Corte
Constitucional Brasileira. Os juízes teriam que decidir qual das duas teses
seria "agasalhada" pela Constituição Federal.
Do lado direito, os argumentos sobre a inconstitucionalidade das cotas
giravam, basicamente, sobre três eixos: a) Os cidadãos são iguais perante a lei
e as cotas violam esta a igualdade, constituindo-se em privilégios de
determinada faixa da população às expensas de outras faixas; b) As cotas
destroem o sistema meritocrático já que não premiam os esforços individuais, os
melhores; c) O Brasil não é um país racista, ao contrario, somos tolerantes e
cordiais. Em se instaurando as cotas raciais nas universidades, nos tornaremos
racistas, um país segregado, à beira de uma guerra civil.
Do lado esquerdo do ringue, os argumentos sobre a constitucionalidade das
cotas: a) O Brasil é um país extremamente injusto e preconceituoso, e isso nega
direitos fundamentais às pessoas; b) A manutenção de tal situação é que atenta
contra a igualdade de oportunidades, contra os esforços, contra o mérito
pessoal; c) Sim, somos racistas e, mais que isso, a sociedade é tolerante com a
segregação.
A contenda prometia. O Brasil parou pra ver. Ambos os lados se esforçaram
nas defesas de suas teses sobre nossa sociedade, nosso país. Argumentos foram
sacados, pesquisas foram utilizadas, autores clássicos, de ambos os lados, foram
trazidos ao centro do ringue.
Como pano de fundo, e mais principal, o que estava em questão não era só a
legalidade (e não obrigatoriedade) das cotas raciais nas universidades. Outras
cotas existem, outras ações afirmativas são aplicadas, sem tanto reboliço, sem a
necessidade desta luta.
O que estava em questão, que seria o mote da decisão dos ministros do
Supremo Tribunal Federal, era: O que é o Brasil? Uma democracia racial,
miscigenada, com igualdade plena de direitos entre seus cidadãos independente de
cor, raça? Ou um país que mascara sua segregação racial, dando uma demão de
tinta que esconde, embaixo de si, um preconceito que condena milhões à
exclusão?
Depois das defesas das teses, o momento mais esperado. A decisão dos dez
juízes, dos ministros do STF. O que viria dali em diante seria emocionante, ou
pelo menos era o que se aguardava.
Um a um os ministros foram votando, dando cada um sua tese. Placar unânime:
10 x 0 a favor da constitucionalidade das cotas raciais (novamente, não sua
adoção obrigatória). Placar elástico, unânime. Não teve emoção alguma, mas, por
isso mesmo, foi extremamente emocionante.
O STF, com esta decisão, disse, afirmou, reiterou, que vivemos numa
estrutura perversa, racista, e que, por isso mesmo, não meritocrática. No
entendimento dos ministros, as cotas raciais, ao contrário de instaurar uma
guerra civil, tentam remediá-la; ao contrário de inserir o racismo no seio de um
povo cordial, alegre e tolerante, tentam, até quando for necessário, construir
uma sociedade mais justa e plural.
Em síntese: Precisou que dez ministros dissessem, unanimemente, que há
racismo no Brasil, que os negros sofrem uma segregação não institucional, mas
nem por isso mais aceitável.
Não precisaria chegar até a mais alta corte do país. Pouparia enorme
trabalho aos membros do Supremo se, simplesmente, perguntássemos a um policial,
a um segurança de boate, a um porteiro.
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