segunda-feira, 7 de maio de 2012

Já começo o mês com os cofres no vermelho

Tribuna da Bahia - Paulo Roberto Sampaio Diretor de Redação
A primeira imagem que se vê do gabinete do prefeito João Henrique no Palácio Thomé de Souza é uma vista deslumbrante da Baía de Todos os Santos, com o Forte de São Marcelo a emoldurar a paisagem. Mas é exatamente no lado oposto, onde um painel emoldura a parede, que seus olhos brilham e ele renova as energias a cada dia. A foto retrata os contrastes dessa centenária cidade.

A Salvador urbanizada, de belos prédios com o perfil de uma grande metrópole e a cidade informal, que se ergue à sua volta, onde a pobreza é vizinha do medo, onde os becos e vielas pedem urbanização e iluminação pública, onde as encostas teimam em deslizar na primeira chuva, mas ainda assim são ocupadas por quem não tem um teto. Uma Salvador marginalizada, que aprendeu a se contentar por muitos e muitos anos com algumas obras e tímidas intervençóes do poder público, a receber os postes que já não mais serviam para iluminar as ruas dos bairros nobres.

O rebuscalho de uma cidade desigual. É diante deste quadro que o prefeito João Henrique assegura buscar forças para gerir uma das cinco maiores capitais do Brasil, arrecadando de pouco mais de um milhão de habitantes para atender as demandas de quase 3 milhões. Ou mais. E com um agravante: já começa o mês devendo, ou com uma valiosa fatia da receita comprometida. Algo como R$ 18 milhôes são desviados compulsoriamente dos já combalidos cofres municipais num sequestro do repasse do Fundo de Participação dos Municípios. Dívidas herdadas de gestões anteriores.

Legado malvado e que só começa a ser corrigido a partir dessa gestão, quando a Lei de Responsabilidade Fiscal obriga o gestor a não transferir débitos contraídos em sua administração para o seu sucessor. Nessa entrevista, o prefeito fala das principais carências da cidade, de erros que não mais cometeria como gestor público e alerta para a importância de uma estreita parceria com o Estado e União para viabilizar as intervenções que a cidade precisa. E se julga preparado para um desafio maior no futuro.
 
Tribuna da Bahia - Prefeito qual o maior desafio que o senhor experimentou desde que sentou nessa cadeira?
João Henrique - O maior desafio foi administrar Salvador como uma única cidade porque, por exemplo, este quadro na parede, do nosso lado esquerdo, mostra bem. Na verdade, são duas cidades. A cidade dos que têm e a cidade dos que não têm. Você tem que arrecadar impostos e tributos da cidade que tem e aplicar na cidade que não tem. Manter esse equilíbrio é o grande desafio. Oferecer saúde pública, educação, transporte, empregos a essa cidade carente, que é a cidade de onde eu venho, que é o interior da Bahia. São pessoas que vieram do interior e, não tendo condições de morar em melhores condições, moram dessa forma. O grande desafio, eu diria que é administrar a cidade como se fosse uma única cidade, ou seja, o mesmo amor e a mesma atenção que são dados à Cidade Alta, devem ser dados à cidade carente.
 
Tribuna - O senhor acha que essa foi a grande marca da sua gestão?
João Henrique - Foi. Tanto que na minha reeleição, quando a cidade melhor situada economicamente duvidava da minha eleição, a cidade mais pobre, a cidade menos beneficiada, foi a cidade que me conduziu para mais quatro anos à frente da prefeitura. Foi a cidade mais carente, o subúrbio, Cajazeiras, as ilhas, enfim, eles viram essa quebra do paradigma, a percepção dessa mudança de comportamento de que a prefeitura, agora, os olhava, tinha carinho e atenção por eles.
 
Tribuna - De toda forma, prefeito, a vida é um experimento constante. O que o senhor corrigiria de rumo na gestão da cidade?
João Henrique -
As demandas são, no caso de uma cidade como Salvador, crescentes e infinitas. O que eu poderia ressaltar, no caso de corrigir rumos, é um secretariado técnico e menos político. É o conselho que eu dou, inclusive, para as novas gerações. Eu acho que esse modelo de secretariado indicado por partidos políticos tem que ser superado, precisa ser superado. Eu estou chegando ao último ano do meu governo com um secretariado basicamente técnico e é quando eu estou sentindo mais sinergia na equipe, mais espírito de grupo, mais compromisso com a gestão, com a cidade e com o prefeito. É agora, nesse momento, que eu estou com o secretariado quase que, cem por cento técnico.
Tribuna - Isso significa que a política atrapalha muito a gestão?
João Henrique - Tanto atrapalha como ajuda. Por exemplo: quando uma bancada de deputados federais se mobiliza, em Brasília, para pressionar pela liberação de verbas para o metrô, ajuda. Isso me ajudou muito no meu primeiro governo, quando eu peguei o metrô com percentual pequeno de realização, cerca de 25 a 30% e, hoje, estou com 100% realizado, que são os primeiros seis quilômetros. Tiveram momentos que a bancada federal, em Brasília, se mobilizou suprapartidariamente, do PT ao DEM, para buscar junto ao presidente Lula, pressionar junto ao ministro das Cidades, da época, Márcio Fortes, pelas verbas do metrô. Então, a política, nesse momento, ajudou no momento de mobilização das bancadas. Do senado, da câmara federal para brigar pela Bahia. Por outro lado, a política prejudica no momento em que você tem que colocar compor um secretariado por indicações políticas.
Tribuna - Ordenar uma cidade como Salvador, que já nasceu cheia de vielas, cheia de becos, parece complicado. O senhor tentou, com leis, fazer isso, como a questão dos caminhões no centro, das filas de banco. Por que isso não evoluiu?
João Henrique - Mudar comportamentos e hábitos é muito difícil. Em Salvador, o hábito da informalidade é muito forte. Nós somos uma capital nordestina, pobre, onde muitas pessoas vivem e sobrevivem da informalidade. Aqui é muito diferente de você morar em Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis. Aqui é Nordeste, somos uma cidade pobre num Estado pobre Assim como eu disse, no início da entrevista, que eu vim do interior, mais da metade da população de Salvador migrou do interior também. Chegamos aqui, mão de obra desqualificada, e com isso a informalidade predomina na mão de obra de Salvador, nas construções, nas habitações populares, no trânsito, em tudo. Então, é muito difícil você estabelecer regras para as pessoas cumprirem. Dessa forma, vêm as reações, vão à justiça e conseguem liminares. Foi assim, por exemplo, quando eu tentei instituir a obrigatoriedade de ter empacotadores nos supermercados. Perdi na Justiça. A obrigatoriedade da carga e descarga em horários fixos e pré-determinados, à noite e de madrugada. Perdemos na Justiça. Ganhamos o estacionamento dos shoppings, mas ganhamos lá atrás quando eu era deputado. Talvez, hoje, não tivéssemos o êxito que tivemos.
Tribuna - No campo político, na sociedade organizada, em todos os setores que giram em torno da vida da cidade, quem mais o ajudou e quem mais o atrapalhou nesses sete anos de gestão?
João Henrique - É difícil nominar um ou dois. Eu diria que há um conjunto de órgãos de controle externo que, muitas vezes, até querendo ajudar, atrasam nossos cronogramas. Por exemplo, eu entrei aqui na prefeitura e eu já ouvia falar da inauguração do Hotel Hilton, aqui na Cidade Baixa. Eu estou saindo da prefeitura e o Hotel Hilton não levantou um tijolo, ainda. Eu soube que ele vai requalificar todo aquele quarteirão do Mercado Modelo. O Aeroclube, na Boca do Rio, eu entrei aqui na prefeitura, estava aquela ferida urbana, ali. Eu vou sair da prefeitura e continua aquela ferida urbana, ali. Os órgãos de controle externo, muitas vezes, no bom propósito de ajudar, atrapalham o cronograma e as ações do poder público. E aos olhos da comunidade, da sociedade, parece que é o poder público que é inoperante, oportunidades como essa são importantes para esclarecer isso aos baianos.
Tribuna - Isso significa que onde o senhor pôde agir e a realidade é outra?
João Henrique - Sim. Feridas urbanas que maculavam a cidade nós transformamos em lugares de gentileza urbana. A fábrica da Barreto de Araújo era uma ferida urbana, hoje, é uma praça, um local para atos de gentileza urbana, para as famílias conviverem. O Clube Português, da Pituba, era um câncer urbano e nós transformamos em uma área de gentileza urbana. O canal aberto do Imbuí, o canal aberto da Centenário, tudo isso nós transformamos de ferida em gentileza. É como Jaime Lerner chama, “a verdadeira acupuntura urbana”.
 
Tribuna - Muitas vezes o gestor evita abordar, mas eu queria saber: o Ministério Público tornou-se onipotente? Ele extrapolou, ele acaba limitando ou fazendo cobranças que o gestor não tem como atender? Qual o seu sentimento?
João Henrique - Sim, e não é só o Ministério Público. O Tribunal de Contas dos Municípios também e, às vezes, você tem conflitos entre determinações do TCM versus determinações do MP. Às vezes, eu tenho que assinar certos TACs, aqui, com o MP, que são contraditórios a certas determinações que eu tenho do TCM. Imagine a posição que nós nos encontramos: obedecer ao TCM ou ao MP, quando as ordens são contraditórias, são antagônicas? Esse é o papel de um prefeito também, decidir a qual dos dois órgãos você vai desobedecer para obedecer ao outro.
Tribuna - Quando o senhor começa um mês como está o caixa da prefeitura? Quanto estima dispor para gastar com obras?
João Henrique - A gente só gasta, Paulo, em manutenção e conservação da cidade porque o dinheiro que é arrecadado por ano só dá, e somente só, para manutenção e conservação. E mesmo assim, muito mal, não é nem aquela manutenção e aquela conservação que a gente gostaria de dar para a cidade. A receita de Salvador é muito baixa, Salvador tem uma população que não condiz com o tamanho da receita. Por isso que, das 26 capitais, nós ficamos em vigésimo quinto lugar. Quando você divide o tamanho da população pelo tamanho da receita, ou seja, receita pública per capita, você tem algo em torno de R$800 para gastar por habitante/ano. Isso dá para gente o 25º lugar em receita pública per capita. Isso sem contar que nós inauguramos um posto de saúde e daqui a um ano ele já estará pequeno. Parece que encolhe de tamanho. Você inaugura uma escola e daqui a um ano ela já estará pequena, você inaugura uma praça e daqui a um ano ela já estará pequena. Tudo fica pequeno muito rápido, em Salvador, porque a velocidade de crescimento populacional é muito acelerada.
 
Tribuna - A imigração continua grande, prefeito?
João Henrique - São cinquenta mil novos habitantes por ano e que vêm maciçamente para essa parte de baixo da cidade. A grande parte vem morar aqui, na cidade informal, onde a demanda pelos serviços públicos é maior. Pelo posto de saúde, pela escola, pela limpeza, pela iluminação, pela segurança, pelo emprego, pelo transporte, por tudo a demanda nessa cidade informal é muito maior do que a demanda na cidade formal. E os serviços públicos são mais consumidos aqui, do que lá na cidade formal. Pois bem, a receita é baixa, o crescimento da população é aceleradíssimo,
 
Tribuna - Os números são realmente preocupantes, não?
João Henrique - Salvador tem o maior crescimento de população do Brasil, segundo dados do IBGE, e nós temos também a maior concentração populacional do Brasil. Existem bairros, em Salvador, que chegam a ter vinte mil habitantes por quilômetro quadrado. A média da cidade é dez mil por cada quilômetro quadrado, mas tem bairros, como o Nordeste de Amaralina, que chegam perto de vinte mil por quilômetro quadrado. O bairro da Liberdade, também, chega a vinte mil habitantes por quilômetro quadrado. Comparando com São Paulo, são sete mil e quinhentos habitantes por quilômetro quadrado.
 
Tribuna - E onde alojar todo esse contingente que chega à cidade?
João Henrique - O nosso problema, se é que é problema, é o mar. Não é problema, mas do ponto de vista da densidade demográfica, é. Salvador é uma faixa de terra, um cabo geográfico, cujo vértice é o Farol da Barra, que avança sobre o mar e ali dentro você tem que hospedar três milhões de habitantes. Ao fundo tem Lauro de Freitas e Simões Filho. Você tem um triângulo para povoar, por isso eu torço para que saia logo essa ponte Salvador-Itaparica. Na hora que sair essa ponte de quatorze quilômetros, nós vamos ter um dreno demográfico porque a extensão da ponte vai ser a extensão da Avenida Paralela. Quantas pessoas moram em Vilas do Atlântico e vêm trabalhar em Salvador? Quantas pessoas moram em Buraquinho, Camaçari e vêm trabalhar em Salvador?
 
Tribuna - Então 14 quilômetros nos separam de uma nova Salvador?
João Henrique - São 14 preciosos e importantes quilômetros. Muita gente vai poder morar lá ou trabalhar lá e morar cá, enfim, nós vamos ter a possibilidade de ter um desenvolvimento econômico e social do lado do recôncavo, nas ilhas de Itaparica e Vera Cruz, Santo Antônio de Jesus, enfim, nesse lado do recôncavo. Isso vai ajudar a dar uma opção a mais de moradia para as pessoas, ativar nossa atividade econômica, já que a cidade está com a maior ocupação demográfica por quilômetro quadrado do Brasil, mas com a vigésima quinta receita mais pobre do país.
Tribuna - Isso significa que a cidade está saturada, do ponto de vista populacional?
João Henrique- Saturadíssima. Veja o Projeto Minha Casa Minha Vida. Nós só conseguimos áreas na Via Parafuso, na estrada CIA/aeroporto. Ali conseguimos algumas áreas. Pode reparar, os poucos projetos Minha Casa Minha Vida que nós temos em Salvador ou foram feitos em Cajazeiras, algumas áreas remanescentes de Cajazeiras ou na estrada CIA/aeroporto, na Via Parafuso. A cidade está completamente saturada, nesses mapas na parede você vê como a cidade está concentrada populacionalmente. Mas tudo isso tem rebate, aonde? Na segurança pública, que embora seja responsabilidade do Estado, interfere na qualidade de vida, de um modo geral, da população.
Tribuna - Que leitura o sr. faz da qualidade de vida em nossa cidade?
João Henrique - A ONU tem um dado, Paulo, chamado optimo populacional. Esse optimo populacional quer dizer o ideal de população para aquela cidade. Salvador está com quase o dobro do optimo populacional estabelecido pela ONU, ou seja, o impacto na qualidade de vida é muito forte. Porque uma cidade planejada, com uma população proporcionalmente correta ao tamanho do território da cidade, você tem qualidade de vida. Mas, uma cidade onde você tem quase o dobro da população, do ponto de vista do planejamento urbano ocupando aquele mesmo território, impacta na qualidade de vida. Dessa forma, você vai ter postos de saúde mais cheios, escolas públicas mais cheias, segurança pública mais vulnerável. Eu digo segurança pública em uma cidade que tem uma desigualdade social extremamente gritante, então isso é agravante para a segurança pública, essa distância social entre pobres e ricos e a cidade concentrada populacionalmente é algo realmente preocupante. Esse rebate na qualidade de vida, pelo tamanho da população versus o tamanho do território, é muito forte.
Tribuna - O senhor admite que a receita do município é insuficiente para oferecer uma qualidade de vida dentro do padrão desejado por todos. Com isso, o senhor acha que Salvador vai continuar refém ou dependente do Estado e da União para crescer?
João Henrique - Com certeza. Os projetos de mobilidade urbana, por exemplo, são projetos federais. As obras do metrô de Brasília, Fortaleza, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, são obras federais. Os investimentos em transporte de massa sempre são investimentos federais porque requerem aporte de recursos que uma prefeitura não dispõe.
Tribuna - E como anda a capacidade de endividamento da Prefeitura?
João Henrique: A prefeitura de Salvador não tem capacidade para tomar empréstimos e por conta disso depende, mesmo, de investimentos federais a fundo perdido, o que é mais difícil, ainda. Sempre vamos ter essa dependência, daí esperamos que haja melhor repartição desse bolo tributário. A nossa fé, a nossa esperança é que isso seja revisto. Não é possível. Tantos deputados federais que já foram prefeitos e estão, hoje, no Congresso Nacional e não se sensibilizam. Eu acho que tem que haver uma tomada de consciência no Congresso Nacional.
Tribuna - Fala-se muito de uma herança maldita que lhe coube quando assumiu a prefeitura. Do que se trata?
João Henrique - Eu tenho sequestrado na fonte, por exemplo, cerca de R$18 milhões por mês, do Fundo de Participação dos Municípios. Há meses que esse valor diminui um pouco, cai para 15 milhões, há meses que sobe para 18. Ou seja: eu já começo o mês com os cofres no vermelho. Eu exemplifico. Nós temos até 18 milhões por mês sequestrados, de dívidas e gestões bastante anteriores à minha. São dívidas do INSS, do FGTS, são dívidas trintenárias. A dívida previdenciária, por exemplo, é trintenária. Dívidas de lá de trás que eu pago até hoje porque foi feita uma consolidação dessas dívidas, foi levantado um número e esse número é mensalmente retirado na fonte, antes do FPM ser repassado. Varia de 15 a 18 milhões todo mês.
Tribuna - Então a cidade paga hoje o preço de gestores irresponsáveis no passado?
João Henrique - Pois é e esse dinheiro faz muita falta, mas no passado não existia Lei de Responsabilidade Fiscal. Um prefeito podia passar a prefeitura para o seu sucessor com dívidas. Eu sou o primeiro prefeito que está tendo a obrigação de passar para o meu sucessor uma prefeitura sem dívidas porque a lei de responsabilidade fiscal, finalmente, começa a ser cobrada dos gestores. Mas só agora, a partir dessa nossa geração de prefeitos. E é importante que a sociedade tenha consciência disso. Nossos gastos são limitados ao orçamento. Esses prefeitos que estão saindo junto comigo fazem parte da primeira geração de prefeitos obrigada a passar a prefeitura para o sucessor sem dívidas. Se assim fosse, nos últimos 30 anos, eu não estaria, hoje, pagando cerca de 18 milhões por mês de dívidas contraídas pelos prefeitos que ocuparam essa cadeira nos últimos 30 anos. E a cidade teria uma capacidade de investimentos em obras muito grande, mas poucos atentam para isso.
Tribuna - Apesar de todo esse arrocho financeiro, o senhor conseguiu oferecer uma melhoria salarial para os pelos professores do município. Como foi possível isso?
João Henrique - Herança de João Durval. Eu aprendi em casa, isso. Tratar bem, com respeito, com dignidade o funcionário público. Mas não foi só na área da educação não. Na saúde também tiveram aumentos da ordem de 100 a 120% com a implantação do novo plano de cargos e salários da saúde. Para os professores nós demos 121% nesses sete anos e meio. No plano de cargos e salários da saúde tiveram aumentos muito bons que variaram entre 50 e 120%.
Tribuna - O senhor disse, em recente entrevista, que talvez, um dos dias mais tristes de sua gestão, quiçá de sua vida, foi quando o senhor teve que, forçado pela justiça, autorizar a demolição das barracas. Nós vamos continuar convivendo com essa orla até quando?
João Henrique - Pois é. Ainda hoje, eu recebi a visita, aqui, do grupo que está refazendo a orla marítima do Rio de Janeiro. Eles estiveram aqui me visitando e sugerindo propostas para a orla de Salvador. Realmente, a orla do Rio do Janeiro está muito bonita, agora, o que aconteceu aqui? Primeiro, a determinação da Justiça Federal para demolir todas as barracas sob a alegação de que eram barracas construídas em caráter fixo e permanente sobre as areias e que as areias são patrimônio da União. Houve toda aquela celeuma, toda aquela polêmica com a SPU (Superintendência do Patrimônio da União), a Justiça Federal entrou e acabou por determinar aquela demolição. Inicialmente foram cerca de 500 barracas e no segundo momento, também cerca de 500 barracas.
Tribuna - Com efeitos danosos para uma parcela importante da economia da cidade, sim?
João Henrique - O Sebrae até publicou um livro onde fala que, em Salvador, cerca de 30 mil pessoas sobreviviam da economia das barracas de praia. Era uma economia forte. A decisão da Justiça Federal tinha que ser cumprida, foi há 20 dias da eleição, me deu um prejuízo político enorme, aos candidatos que eu estava apoiando e à minha imagem também, naquele momento. Foi um prejuízo político incalculável, mas era uma ordem da Justiça Federal e tinha que ser cumprida.
 
Tribuna - E daí em diante, o que foi feito?
João Henrique - Nós apresentamos à Justiça Federal uma opção de reordenamento das barracas na orla. A Justiça Federal montou a chamada “Comissão dos Notáveis”, a qual apreciou nossa proposta e fez algumas sugestões de ajuste. Nós reapresentamos a proposta já com esses ajustes e até hoje não tivemos uma resposta. Tudo que precisa ser feito na orla, hoje, há uma determinação da Justiça Federal, seja ocupação de caráter provisório ou permanente, deve ser submetido à Justiça Federal.
 
Tribuna - E qual a sua concepção para a nova orla da cidade?
João Henrique: A orla de Salvador, Paulo, eu acho que precisa muito mais do que um reordenamento de barracas. Hoje, a orla de Salvador, que foi feita em 1986 e inaugurada por João Durval, naquele trecho Jardim dos Namorados até a sereia de Itapoan, hoje, já precisava de uma reurbanização. A cidade cresceu muito, as pistas que eram largas na época, hoje, com o número de carros que há na cidade e com as ocupações residenciais e comerciais que chegaram à orla marítima já demandam nova urbanização da orla. E aí, não deve ser apenas essa orla alta, mas sim uma reurbanização que venha desde a praia de Inema até a praia do Flamengo. Eu penso Salvador como um todo. Dos que têm maior e dos que têm menor renda. Ela é o lazer democrático acessível a todos da cidade.
 
Tribuna - O que fazer para que isso aconteça?
João Henrique - Eu acho que só uma grande mobilização com todos os atores na mesa. Porque, até então, o que tem acontecido é uma queda de braço entre a prefeitura e a Justiça Federal.
 
Tribuna - Indo um pouco para o campo político, o senhor sempre fez boas referências ao governador Jaques Wagner, mas, hoje, vocês divergem na questão do metrô. Independente dessa abordagem do metrô, ele lhe ajudou mais ou atrapalhou mais?
João Henrique - O governador sempre ajudou nessa e em outras questões também. A única discordância que nós temos, em relação ao momento de colocar o metrô para funcionar, é porque nós queremos iniciar já, urgentemente, a fase de pré-operação ou operação assistida ou operação branca, tem essas três denominações. Pode estar havendo, até, um mal entendido e estar gerando esse curto circuito. Na verdade, o que nós estamos defendendo é o início da fase de pré-testes.
Tribuna - Então, prefeito, talvez essa entrevista contribua para pôr fim a esse impasse...
João Henrique - Às vezes nós nos comunicamos mal, é tudo questão de comunicação. Poderia, até, dizer aqui que não está havendo discordância com o governador porque, quando a gente fala em inauguração do metrô, prefeitura versus governo, uma defende um prazo e outra, outro, mas não estamos falando de inauguração do metrô. Se a gente for descer ao detalhe, talvez não esteja havendo nem discordância.
Tribuna - Quer dizer que sua proposta é essa...
João Henrique - Para deixar bem claro, eu acho que não está havendo nem discordância, eu acho que está havendo é má comunicação, é um curto circuito.
Tribuna - A prefeitura coloca subsídio hoje no transporte da cidade?
João Henrique: Hoje, a prefeitura coloca nos trens cerca de um milhão e meio por mês para as pessoas poderem pagar cinquenta centavos. Se não fosse esse valor que a prefeitura coloca todo mês, a tarifa não seria cinquenta centavos. Se não fosse o valor que eu coloco todo mês no Elevador Lacerda, a tarifa não seria quinze centavos. O plano da Liberdade, também, eu subsidio. Tem muita coisa subsidiada na cidade, daí pergunto: por que não subsidiar o metrô? Todos os metrôs do mundo são subsidiados, até os que são operados pela iniciativa privada. São subsidiados porque o preço da tarifa não repõe os custos de operação de um metrô. O próprio metrô da Paralela, na licitação que foi colocada, também prevê subsídio governamental.
Tribuna - Prefeito, quem vai sentar nessa cadeira no dia primeiro de janeiro de 2013? Tem uma bola aqui...
João Henrique - Mas é uma bola da Copa do Mundo, não é de cristal não. Parece cristal, mas é bola de Copa do Mundo. Paulo, é muito difícil prever. Realmente, essa eleição, em Salvador, está imprevisível. Eu vejo um momento bom da administração pública municipal, vejo a população, sobretudo das áreas de ocupação informal, muito satisfeita com esse tratamento, essa quebra de paradigma que nós propiciamos na cidade, tratar a cidade toda por igual. O mesmo investimento de iluminação pública que você vê na Avenida Suburbana, você vê na Barra, em Ondina, na Graça, os mesmos postes azuis que você vê lá embaixo, no subúrbio, você vê aqui em cima na Barra, a mesma ambulância do SAMU que serve lá embaixo serve aqui, o mesmo ônibus que serve lá, serve aqui. Coisa que, historicamente, em Salvador, não era assim.
Tribuna - Voltando no tempo, há uma nova forma de fazer política?
João Henrique - Eu fui vereador dessa cidade muito anos, fui deputado estadual eleito por Salvador outros tantos anos e o que a gente via era isso, equipamento público que não servia mais nos bairros nobres era mandado para servir lá na cidade baixa, o ônibus que não servia mais aqui na cidade alta era encaminhado para servir no subúrbio. Isso ninguém apaga, está na história. Tudo que não servia na cidade alta era mandado para servir na cidade baixa. Essa quebra de paradigma levantou a autoestima da população carente da cidade.
Tribuna - Como andam as conversas do senhor com eventuais aliados?
João Henrique: Nós temos um candidato que é João Leão, do meu partido, o PP. Eu não me vejo, no momento, em condições de conversar com nenhum outro candidato, na medida em que o nosso partido tem candidato.
Tribuna - Concluindo, prefeito, e 2014. O que o senhor tem como objetivo?
João Henrique - O governo do Estado com muita determinação e firmeza. Tem coisas na vida que são naturais, que você não precisa forçar a barra e tem coisas na vida que você sente que é forçação de barra e essas, geralmente não dão certo. Já as coisas naturais, todo o universo acaba conspirando e empurrando-as. Eu estou sentindo que é uma coisa natural, ter passado oito anos na prefeitura de Salvador nos deu a experiência, o conhecimento, a maturidade para enfrentar problemas estaduais.
Tribuna - Aprendeu na vida...
João Henrique - É na adversidade que o ser humano cresce, todos sabemos disso. Eu acho que esses oito anos deram para tirar o cascalho, a sujeira do diamante. As adversidades nos ensinaram muito mesmo. Hoje, faria muita coisa diferente, nada substitui a experiência.
Tribuna - Qual seria a grande bandeira que o senhor haveria de empunhar, candidato ao governo da Bahia?
João Henrique - São muitas, mas para não perder a tradição da família, uma, é tratar muito bem o funcionalismo público. Isso é para manter a tradição da família e por uma questão de reconhecimento e de justiça, também, ao funcionalismo como um todo, não é? Desde policiais, médicos, professores, funcionários em geral. Seria uma questão de manter o nome do meu pai, tudo que meu pai fez o filho não pode decepcionar e eu gosto do servidor público. Eu acho que o servidor público de carreira precisa ser mais prestigiado, mais reconhecido. E outras bandeiras, eu vejo, por exemplo, essa questão da seca quando tudo que meu pai fez aqueles milhares de poços, na época à SERB, as barragens em São José do Jacuípe, que, até hoje, a região do sisal é muito agradecida a João Durval, pela barragem de São José do Jacuípe, pela barragem de Pedra do Cavalo, a região do recôncavo é muito reconhecida a João Durval. Enfim, eu acho que são muitas bandeiras, mas, sobretudo interiorizar o desenvolvimento.
Tribuna: Que lição a Prefeitura vai lhe deixar em relação a quem vive distante da capital?
João Henrique: Como prefeito de Salvador, uma coisa que me chocou muito e continua me chocando, - o mandato ainda está em curso, ainda temos alguns meses, - é o fato de as pessoas, assim como minha família virem para a capital por não terem opções de desenvolvimento, de emprego, não terem ofertas de saúde de média e alta complexidade no interior. Têm que vir buscar na capital. Quantas horas uma pessoa passa em uma ambulância nessas estradas onde muitas delas não são estradas boas, ainda? Não são nem asfaltadas e, muitas das vezes, a capital é a salvação. Quantas pessoas, imagine, 12 milhões de baianos, a se voltar para Salvador em busca de um socorro nos casos mais graves porque toda média e alta complexidade na saúde está praticamente concentrada em Salvador. Alguma coisa em Vitória da Conquista, em Ilhéus, Feira de Santana, mas o grosso mesmo, da média e alta complexidade da saúde pública é ofertada na capital. Imagine os pais que têm que sustentar os filhos na capital porque lá no interior não tem determinados cursos universitários ou determinados cursos de formação média, especializados. Têm que mandar os filhos para a capital e sustentá-los na capital e separá-los da família.
 
Tribuna: Na sua visão, o futuro da Bahia está no interior?
João Henrique: Precisamos muito interiorizar o desenvolvimento, levar desenvolvimento, saúde pública, cursos médios e técnicos e universitários para o interior da Bahia, levar bons empregos, indústrias e fábricas de ponta, ou seja, você tem que desconcentrar o atendimento à população da Bahia. Salvador não pode continuar, e eu ouvi muito esses oito anos, aqui, sendo, praticamente, um minigoverno do Estado. Na medida em que você não acha na sua cidade natal o que você precisa, o caminho é em direção a Salvador e isso vem propiciando essa superpopulação da cidade, comprometendo a qualidade de vida de todos que aqui estão e que para cá vieram. Todos nós baianos, de maneira geral, acabamos povoando nossa querida capital. Eu acho que, é bom para todos que a Bahia tivesse seu desenvolvimento, geograficamente, mais bem distribuído. Esse é um problema histórico, não podemos culpar o atual govenador por isso, mas é algo que precisa ser imediatamente combatido com políticas públicas de desconcentração do desenvolvimento do crescimento econômico do Estado da Bahia. É crônico, mas precisa ser imediatamente enfrentado. E sentado aqui na cadeira de prefeito de Salvador, eu tive essa visão panorâmica que poucos tiveram a oportunidade de ter. Eu senti, aqui, o drama do interior da Bahia, os problemas do interior da Bahia, as ausências de certos serviços públicos no interior da Bahia. Esses oito anos foram uma espécie de pós-graduação.
Colaborou: João Arthur Matos

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