Tribuna da Bahia
Osvaldo Lyra EDITOR DE POLÍTICA
O economista José Sérgio Gabrielli está há 100 dias à frente do
planejamento do Estado. Nesta entrevista à Tribuna, o
petista aponta os principais gargalos para o desenvolvimento da Bahia (sobretudo
a falta de logística), cita a necessidade de ‘azeitar’ a máquina e atacar o
excesso de superposição de atividades do governo, preparando a pasta para atuar
por projetos. Questionado, Gabrielli diz não concordar com a ideia de que há
morosidade nas ações do governo Wagner. Muito pelo contrário. Para ele, o
momento é de pujança. Até 2015, serão investidos R$70 bilhões pela iniciativa privada, somados aos
R$20 bi do poder público
Tribuna da Bahia – Cem dias de José Sérgio Gabrielli à frente do
Planejamento do Estado. O que foi feito nesse período?
José Sérgio Gabrielli – Quando eu cheguei à Bahia,
eu entrei num time que já estava jogando. Portanto, tive que me adaptar às
orientações táticas do governador, que é o técnico. Então, objetivamente, o
primeiro elemento que coloquei em prática nesse período foi atuar para conhecer quais eram as
principais atribuições das diversas secretarias do Estado. No segundo momento
foi possível identificar onde é que estava havendo superposição de atividades,
necessitando armar o jogo de forma um pouco distinta. No terceiro momento foi
preparar a Secretaria de Planejamento para analisar e ser capaz de dar respostas
a cada projeto de ação da secretaria. Um quarto momento foi a preparação da Lei
de Diretrizes Orçamentárias. Um quinto momento importante agora é a gestão de
2012 com definição de prioridades e fazendo com que a gestão de 2012 acabe
impactando o orçamento de 2013.
Gabrielli – Concluindo, esse processo, ainda tem
outro componente que é importante, que é componente de buscar acelerar os
processos de captação de recursos não tradicionais, ou seja, buscar novas fontes
de financiamento para o estado. Esse conjunto de ações está em andamento,
evidentemente que se você me perguntar, concretamente, o que isso deu, eu não
tenho ainda como dar uma resposta, são 100 dias, mas todas essas áreas de
atuação estão em plena atividade. Acredito que o governo vem fazendo muita
coisa, ou seja, o conjunto de ações do governo é um conjunto extraordinariamente
amplo. Acho que a Bahia tem hoje tanto na área do investimento privado, como na área do investimento público, um
pacote de investimentos, um pacote de projetos, talvez o maior da história. Nós
temos hoje cerca de R$ 70 bilhões de investimentos privados planejados para a
Bahia até 2015 e temos do setor público, só na infraestrutura, cerca de R$ 20
bilhões. Então significa que você tem aí, do setor público, governo do estado,
governo federal e governos municipais, cerca de R$ 20 bilhões, mais R$ 70
bilhões, são R$ 90 bilhões, são US$ 45 bilhões. Só pra lembrar, o Polo
Petroquímico custou US$ 6 bilhões. Nós estamos com investimentos que
correspondem, em termo de valor, a sete ou oito vezes o Polo Petroquímico,
portanto, é um enorme volume de investimento nos próximos anos.
Tribuna – O senhor trouxe alguém do seu staff da Petrobras pra dar
suporte nesse trabalho na Secretaria de Planejamento?
Gabrielli – Ainda não. Mas vou trazer.
Tribuna – E isso não deixa o senhor limitado, sem uma equipe mais
próxima, que está mais acostumada com seu ritmo de atuação?
Gabrielli – Eu cheguei e não mudei o time. Eu cheguei e
estou jogando com o time existente. Eu trouxe o chefe de Gabinete, que é do
estado, um amigo meu de muito tempo, que trabalhava na Secretaria de Educação e
é meu chefe de Gabinete agora. E estou trazendo um gerente da Petrobras que está
vindo cedido para trabalhar comigo a partir do próximo mês, mas o resto dos
superintendentes eu mantive todos eles, eu não troquei ninguém. Quem saiu, saiu
por vontade própria.
Tribuna – Quando o senhor assumiu, o senhor falou em fazer ajustes
na máquina. O senhor encontrou alguma dificuldade em mexer em alguma peça, em
fazer algum ajuste?
Gabrielli – Não, eu preferi testar as pessoas que estavam
nas diversas posições. Então eu tive o que eu estou tentando fazer, uma gestão
por projetos. Estou identificando claramente o que cada pessoa faz, estou dando
pra ela prazos e metas e estou discutindo o processo de encaminhamento desses
prazos e metas. Estou montando, dentro da secretaria, um sistema de
acompanhamento dos projetos que vai permitir uma visão gerencial das atividades
que estão sendo feitas e, com isso, eu tenho uma visão muito macro de todas as
atividades que estão sendo feitas pela secretaria. Com prazos, com metas, com
responsabilidades.
Tribuna – Quando a população de um modo geral vai perceber esse
novo processo de organização interna?
Gabrielli – Não. Isso não tem uma relação direta com a
população, porque não tem execução direta das atividades de governo. Isso aí
você vai ter uma aceleração dos processos de integração dos diversos órgãos
executores, você vai ter uma melhoria do uso dos recursos com menos desperdício,
você vai ter mais eficácia na formulação de projetos pra buscar recursos
externos, você vai ter um processo de acompanhamento do orçamento de forma a
integrar os dados financeiros com a execução, ou seja, você vai ter uma atuação
na atividade meio, a gente não vai ter uma atuação na atividade fim. O que nós
vamos fazer é que as secretarias, que são as executoras das obras, das
atividades, elas vão estar mais coordenadas, vão estar mais azeitadas e jogando
nas posições mais adequadas.
Tribuna – O senhor tem encontrado alguma dificuldade interna,
dentro do próprio governo, para se movimentar?
Gabrielli – Não, nenhuma dificuldade. Eu acho que o
problema é que a equipe do governo é muito motivada, muita atividade sendo
feita, eu acho que, em alguns casos, muita gente fazendo a mesma atividade. É
preciso, digamos, arrumar um pouco mais isso, mas o governo está muito ativo. Eu
não concordo com a ideia de que não há atividade no governo, que há morosidade
na atividade do governo. O governo está muito ativo, agora talvez haja muita
energia que é usada na atividade pra preparar a atividade.
Tribuna – O governo vai conseguir construir um sistema de
mobilidade eficiente para a Copa ou qual o planejamento do Estado para o
mundial?
Gabrielli – Olha, eu acho que nós temos na mobilidade uma
questão central para Salvador. A consulta pública que foi lançada apresenta um
projeto que me parece extremamente importante e tem algumas características que
valem a pena chamar a atenção. Primeiro, ele não é um projeto completo, no
sentido que resolve todos os problemas. Ele é uma linha que vai conectar a linha
1, que vai expandir a linha 1 até Pirajá e vai fazer a linha 2 até Lauro de
Freitas, basicamente no eixo da Paralela. Esse é um eixo troncal, é um tronco de
um sistema que vai precisar fortemente de redefinir as rotas dos ônibus. A
redefinição das rotas dos ônibus vai ocorrer para utilizar, otimizar e
potencializar as diversas estações de metrô que vão existir nesse trajeto. Vamos
ter uma reorientação das rotas de ônibus, que serão rotas mais curtas, mais
rápidas, algumas circulares, que vão permitir, portanto, uma utilização do
espaço urbano de Salvador de forma mais adequada. Por outro lado, nas linhas
troncais de longa distância, você vai, portanto, tirar também o volume de
automóveis circulando.
Tribuna – O Porto Sul é colocado como uma prioridade do governo. O
senhor tem feito alguma gerência, junto ao governo federal, para destravar esse
projeto?
Gabrielli – O governo tem o secretário Rui Costa (Casa
Civil), que é a pessoa que está fazendo essas negociações com a Valec, com o
governo federal. Nós estamos trabalhando no desenvolvimento dos projetos do
entorno das plataformas, dos pátios de manobra da Fiol. A ferrovia, que termina
no Porto Sul, ela vai ter vários pátios de manobra, que será onde o trem vai
parar e esses pátios de manobra vão ter impactos importantes nas regiões em
torno desses parques. Nós estamos reformulando as análises no entorno desses
locais para fazer políticas regionais adequadas para maximizar o efeito positivo
da ferrovia no desenvolvimento regional.
Tribuna – Qual é o principal gargalo hoje para o desenvolvimento da
Bahia?
Gabrielli – Eu acho que nós temos alguns gargalos. A
logística baiana e a logística nordestina, ou seja, a capacidade de transportar
cargas, pessoas, dados e informações, ela é um limitador. Então nós temos no
plano de transformação da logística, nós vamos ter essa Ferrovia Oeste-Leste,
que é uma ferrovia que cruza o sudoeste do estado. Nós vamos ter que retomar a
discussão sobre a hidrovia do São Francisco, portanto, vai ser na direção
Sul-Norte. Além da hidrovia do São Francisco, em Juazeiro, nós vamos ter uma
plataforma logística e, de Juazeiro, nós vamos reforçar a FCA até o porto de
Salvador e de Aratu. De Salvador e Aratu essa ferrovia vai até Brumado. Então
nós vamos ter um polígono de logística novo do ponto de vista de modais
ferroviários, hidroviários e rodoviários. Por outro lado, nós estamos
intensificando as linhas de transmissão elétrica, que vão permitir explorar mais
ainda o potencial eólico do semiárido baiano, na região de Caetité, e nós vamos
ter que repensar e expandir o plano estadual de banda larga, para permitir
também uma densificação da malha de fibras óticas e de banda larga para a
inclusão digital no estado. Portanto, esse conjunto de ações são ações na
infraestrutura. Então, nós temos limitações na logística, que estão sendo
resolvidas, temos limitações na inovação, que estão sendo tratadas, temos uma
política de inclusão social que expande o mercado interno, resta a qualificação
profissional. Nós precisamos que o nosso pessoal esteja preparado para utilizar
esse crescimento de forma adequada.
Tribuna – O PPA do governo federal prevê R$ 19 bi para a Bahia até
2015 e R$ 42 bilhões para Pernambuco. A que o senhor atribui isso? Falta projeto
ou falta articulação política?
Gabrielli – Os projetos de Pernambuco estão fazendo o
ciclo de investimento que a Bahia fez na década de 50. Na década de 50, nós
tivemos refinaria. Pernambuco está tendo refinaria agora. O polo petroquímico é
outra parte importante no crescimento de lá. Nós tivemos o nosso polo na década
de 70. Então, Pernambuco está com um ciclo de investimento em investimentos
pesados onde o setor público entra fortemente, na área petroquímica, na área de
refino, que a Bahia teve no passado. Então, é evidente que não dá para comparar
nesse nível simplesmente o valor numérico do investimento pernambucano e o
investimento baiano. Por outro lado, se nós olharmos o volume de investimentos
nas universidades, se nós olharmos o volume de investimentos nas escolas, se nós
olharmos o volume de investimentos em moradia, se nós olharmos o volume de
investimento no saneamento básico na Bahia, nós estamos melhor do que
Pernambuco.
Tribuna – A formação de novas parcerias público-privadas poderia
ser usada para destravar processos de desenvolvimento, inclusive na logística do
Polo?
Gabrielli – Eu acho que em algumas coisas, sem dúvida
nenhuma. Nós vamos ter esse ano agora na mobilidade urbana. A Arena Fonte Nova
foi uma PPP. O Hospital do Subúrbio foi uma PPP. A BA-093 é uma parceria PPP.
Agora, eu acho que a parceria público-privada é importante, mas não é universal.
Não vale pra tudo, nem vale para qualquer situação. É preciso identificar aquilo
que se adapta mais no sentido de ser uma forma específica de organização da
atividade econômica. No entanto, eu acho que aproximação com o empresariado é
fundamental para viabilizar a criação de novas oportunidades de emprego e renda,
como para viabilizar a expansão econômica propriamente dita no estado.
Tribuna – De dentro da máquina do estado, qual a avaliação que o
senhor faz hoje do governo?
Gabrielli – Olha, eu acho que o governo tem uma atividade,
como eu disse, muito grande. Talvez a gente pudesse, digamos, ter mais efeito
com o conjunto de atividades que a gente está fazendo se a gente tivesse um
pouquinho mais de coordenação e de diminuição das superposições que nós
temos.
Tribuna – O senhor acha que vai ser possível atingir isso num curto
espaço de tempo, dando uma velocidade maior na máquina?
Gabrielli – Acho que o governador Wagner tem plena
consciência disso, ele é um entusiasta da gestão mais eficiente, ele é um
entusiasta de avançar além dos processos de abertura democrática para que as
ações sejam mais eficazes, e eu acho que ele vai conduzir o governo nessa
direção.
Tribuna – Falando agora sobre sucessão... Qual o motivo de o
candidato Nelson Pelegrino ter dificuldade em tomar fôlego?
Gabrielli – Acho que Nelson está fazendo a parte dele. A
visibilidade dele está bastante grande. Não concordo que não há visibilidade da
candidatura de Nelson. Acho que o quadro político de Salvador, no entanto, é um
quadro político que o PT conseguiu uma frente sem os seus aliados tradicionais.
O PCdoB tem uma candidata colocada nesse momento e isso vai fazer com que a
tática seja uma tática de segundo turno, pelo menos nesse momento. As convenções
vão ser nessa semana, a do PT é no dia 30. Até lá, o quadro que se apresenta
hoje é um quadro em que a base do governo vai ter mais de um candidato.
Tribuna – Independente de qual seja o candidato a vencer esta
eleição, quais devem ser as prioridades do próximo prefeito?
Gabrielli – Eu acho que Salvador precisa de algumas
intervenções importantes. Uma é em mobilidade urbana, sem dúvidas. E nós
precisamos investir na área de saúde, a cobertura do PSF, do programa de saúde
da família, que é ridiculamente baixa. Nós precisamos avançar na área de
saneamento, na capacidade de saneamento da cidade. Nós precisamos avançar num
programa para as orlas, tanto a orla do interior da Baía de Todos os Santos como
da orla atlântica. Nós precisamos repensar o Centro Histórico. Então é todo um
conjunto de questões que Pelegrino está trabalhando nisso e que eu acredito que
vá apresentar alternativas importantes.
Tribuna – O governo não poderia estar ajudando e investindo em
intervenções como essas, como na orla, como no Centro Histórico?
Gabrielli – Nós temos uma constituição em que a
distribuição de funções é clara. O espaço urbano é competência do município. O
estado não pode estar substituindo o município na gestão do espaço urbano. Além
do mais, existem 417 municípios no estado. O governo do estado não pode cuidar
só de Salvador. Tem que cuidar dos 417 municípios do estado. A presença do
estado na área da saúde é também limitada. O estado trabalha no Sistema Único de
Saúde com duas funções. O posto de saúde e a saúde da família são
responsabilidades municipais. O transporte urbano, o ônibus, o estacionamento, o
trânsito é responsabilidade do município.
Tribuna – Seu programa de rádio causou ciúmes em algumas pessoas,
que estavam de olho em 2014. Como viu os questionamentos?
Gabrielli – Qualquer um pode ter a interpretação que
quiser ter. É só ouvir o programa nas quintas-feiras. É um programa de discussão
de temas econômicos. Eu sou um profissional da área há 40 anos. Eu formei em
1971. Sou atuante na área de economia há mais de 40 anos. Então é absolutamente
normal que eu fale de economia, que eu fale de programas econômicos do estado. A
interpretação disso como campanha eleitoral é uma interpretação completamente
equivocada. Os programas têm sido basicamente de discussão de temas relevantes
para a economia baiana, do ponto de vista econômico.
Tribuna – Incomodam os rumores de que o governador Jaques Wagner
teria uma predileção por uma candidatura de Rui Costa em 2014?
Gabrielli – Eu acho que esse é um tema precipitado. O
governador, eu não acredito que esteja discutindo 2014 agora. O governador sabe
que 2012 tem eleição municipal e é importante, e ele tem um programa de governo
extraordinário para desenvolver. E está desenvolvendo. Ele tem se dedicado
fortemente à gestão do estado, à execução das obras e à execução dos projetos. E
à eleição de 2012. Eu acho que, nesse momento, a eleição de 2014 está muito
longe ainda.
Tribuna – O que a gente pode esperar, o que as pessoas podem
esperar da bagagem que o senhor traz para o planejamento do estado a partir de
agora?
Gabrielli – Eu acho que a Secretaria do Planejamento está
começando a ter alguns instrumentos dentro dela para poder desempenhar um papel
mais articulador no estado. Eu espero que a minha contribuição seja justamente
essa: um articulador das ações do governo, azeitar a máquina sob o comando do
governador Jaques Wagner.
Tribuna – É possível então azeitar a máquina e dar um ritmo de mais
celeridade ao governo?
Gabrielli – Eu não sei se necessariamente dar ritmo de mais celeridade,
porque depende do preparo físico dos atletas, mas, com certeza, fazer uma ação
mais integrada da ação do governo é uma intenção importante.
Colaboraram: Fernando Duarte e Lílian
Machado
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