O presidente estadual do PCdoB, Daniel Almeida, faltando menos
de cinco meses para o pleito municipal, em entrevista à Tribuna, voltou a
reiterar que a candidatura de Alice Portugal está absolutamente posta. Por
tabela, ainda que nas entrelinhas, deixou escapar que a tentativa do PT em
construir hegemonia tem incomodado. “Eu não condeno nenhum partido que busque se
consolidar, todos desejam.
Eu penso que o PT, ao longo da sua trajetória, tem evoluído na compreensão que é necessária para fazer alianças, mas ainda tem muita dificuldade de praticar essa compreensão que afirma no discurso”. Por fim, colocando ainda mais lenha na fogueira, afirmou que existe possibilidade de o diálogo com o PMDB avançar.
Eu penso que o PT, ao longo da sua trajetória, tem evoluído na compreensão que é necessária para fazer alianças, mas ainda tem muita dificuldade de praticar essa compreensão que afirma no discurso”. Por fim, colocando ainda mais lenha na fogueira, afirmou que existe possibilidade de o diálogo com o PMDB avançar.
Tribuna da Bahia : Deputado, com o cenário atual da política, existem
boatos de que pode haver um rompimento do PCdoB com o PT. Há essa
possibilidade?
Daniel Almeida: O PCdoB sempre se movimenta em torno de projetos e somos
construtores de um projeto nacional liderado, hoje, por Dilma. Aqui na Bahia
somos, também, construtores de um projeto que levou Wagner ao governo do Estado.
É um projeto que tem forças diversas, fruto de alianças, e é natural que existam
diferenças, pleitos que podem, aqui e acolá, se confrontarem com interesses
distintos. Na eleição municipal as coisas ficam mais explícitas, as diferenças
se explicitam com maior intensidade porque a disputa é local, em volta de
famílias, mas nenhuma dificuldade de participação do PCdoB nesse projeto. Nós
temos absoluta convicção que esse é o melhor caminho e estaremos nele.
Tribuna: Existe ameaça do PCdoB perder a Secopa para o PR?
Daniel Almeida: Quem indica os secretários é o governador, ele nomeia e
exonera. Temos uma parceria sólida com o governo, temos um espaço no governo que
foi combinado com o governador, em nossa opinião, aquém da nossa participação,
mas foi combinado e aceito pelo governador. Temos trabalhado muito intensamente
para cumprir a nossa missão à frente desses espaços, acho que temos um resultado
muito positivo na Bahia Gás, na Setre e na Secopa. É uma boa parceria que se faz
com o governo federal. As ações na área de esportes se articulam com a nossa
presença no governo federal e por isso eu não vejo nenhum sinal que pudesse
justificar alteração dessa relação.
Tribuna: Existe estremecimento, como o senhor falou, mas nada que leve ao
rompimento.
Daniel Almeida: Não, eu não disse que existe estremecimento entre o PCdoB,
o projeto e o governador. Existe conflito de interesses entre todos os membros
dessa aliança, que é natural em um processo eleitoral. Em muitos municípios, o
PT vai disputar com candidatos de outro partido da base, do PCdoB ou de outros.
Isso exige de cada um de nós um esforço maior para não permitir que essas
disputas extrapolem a manutenção do projeto mais geral. Mas a relação do PCdoB
com o governo sempre foi cordial e muito correta, não temos do que reclamar. O
governador tem sido um grande parceiro e a relação com PT também. Essa relação
sempre foi difícil, especialmente quando trata de movimento social, que aí,
existem disputas mais “ranídas”. Nós conhecemos bem o PT porque somos o
principal parceiro. Não há movimentação de afastamento do PCdoB dessa relação
com o PT, mas sim, uma política de afirmação do PCdoB, que quer ter o direito de
disputar espaços, apoiar e ser apoiado.
Tribuna: Com a ida do ex-senador César Borges para o governo federal, os
republicanos vão aderir à base do PT e apoiar Pelegrino?
Daniel Almeida: Acho que tudo é possível. Não vejo, ainda, nenhuma força
política e nenhuma candidatura com o arco de aliança completamente definido.
Todos estão buscando ampliar as alianças. O PT faz isso, o PCdoB faz, o pessoal
da oposição faz e as conversas estão acontecendo. Acho que esses movimentos não
alteram o que está sinalizado, que é a disputa, em Salvador, em dois
turnos.
Tribuna: Há alguma possibilidade da deputada Alice Portugal não se
candidatar?
Daniel Almeida: A candidatura de Alice é uma candidatura que está
absolutamente posta nesse cenário de eleição em dois turnos. Leva em conta a
força que o PCdoB tem em Salvador, leva em conta o desejo que o partido tem de
apresentar essa alternativa à cidade. Eu acredito que a cidade está demonstrando
que quer mais opções. O cenário de hoje não tem nenhuma indicação que possa
justificar a modificação desse projeto.
Tribuna: E se o governador Jaques Wagner insistir na unidade por
Pelegrino?
Daniel Almeida: Eu penso que o governador já percebeu que há uma realidade
que se impõe e que repete disputas anteriores, que é realidade do segundo turno.
Nem a oposição ao governador marchará unida na disputa e nem a base do governo
também. Eu vejo, por exemplo, manifestações da candidatura de Pelegrino em não
desejar ter no palanque João Henrique, que é de um partido da base. Vejo
manifestações de outras forças políticas que querem ter a oportunidade de se
colocarem. Portanto, penso que, hoje, há uma compreensão de que a unidade se
dará no segundo turno e nós estamos prontos para isso. Queremos receber apoio
dos partidos da base se a nossa candidatura for para o segundo turno e estaremos
comprometidos a apoiar uma candidatura da base, caso a nossa candidatura não vá
para o segundo turno.
Tribuna: Por que Pelegrino, candidato do PT, tem dificuldade de pegar
fôlego, de emplacar como favorito?
Daniel Almeida: Não é tão simples explicar. Primeiro, porque a eleição
ainda está muito distante. Nós temos experiências de candidaturas que despencam,
começando bem e outras que crescem, começando lá embaixo. O quadro não está
definido, as alianças que serão feitas podem alterar esse retrato de hoje. É
óbvio que há um senso comum. Um nome que já foi posto para disputa três vezes,
que está permanentemente na mídia e se apresenta como candidato do governo
federal ou do governo do Estado, poderia já ter um resultado maior. Eu não
saberia explicar, mas acho que uma indicação pode ser essa, de que o eleitor
quer, no primeiro turno, fazer uma experiência mais abrangente, ter um leque
maior de opções. Por isso eu acho que essas candidaturas todas compostas têm
fundamento.
Tribuna: O PMDB não se aliou ao DEM nem ao PSDB. Por serem aliados em nível
nacional, o PCdoB vai tentar formar uma aliança com o PMDB para fortalecer Alice
Portugal?
Daniel Almeida: Muitos achavam difícil o PR e o César Borges, que esteve
com o PMDB, vir compor um espaço no governo federal e articular uma retomada em
torno do governo do Estado. Isso afirma o discurso que nós temos feito, de que é
possível fazer aliança com partidos que compõem a base do governo Dilma. O PMDB
é o segundo maior partido da base do governo Dilma, tem sido muito correto no
Congresso Nacional nesse apoio ao projeto mais geral, portanto nós não vemos
razão para não ter aliança com o PMDB. Aliás, eu tenho escutado, nos últimos
dias, que existem conversas entre PT e PMDB, com possibilidade de aliança em
alguns municípios da Bahia.
Tribuna: E isso abriria possibilidade do PCdoB se sentir confortável para
conversar com o PMDB, aqui em Salvador?
Daniel Almeida: O PCdoB mantém o discurso, que se afirma desde o primeiro
momento, que nós temos disposição, sim, de, no arco de alianças que buscamos
para viabilizar a candidatura de Alice, ter o PMDB como aliado. Nunca deixamos
de afirmar essa possibilidade.
Tribuna: Há entendimento para construção de uma via alternativa, dos
partidos da base, para contrapor ao PT?
Daniel Almeida: Não. O PCdoB entende que Salvador deseja renovação
política. Eu penso que essa renovação deve ser apresentada com perfil de
esquerda, vinculada a esse projeto que tem dado certo no Brasil e na Bahia. Não
devemos descuidar desse esforço porque se não construírmos esse caminho, parte
do eleitorado pode achar que a alternativa de renovação pode estar na oposição.
E a renovação posta pela oposição é a velha política do coronelismo que já foi
ultrapassada e derrotada na Bahia, que a gente espera que nunca mais volte. Por
isso que nós afirmamos esse projeto renovador.
Tribuna: A tentativa do PT em construir hegemonia incomoda os
aliados?
Daniel Almeida: Quem está no governo de coalizão, tem o direito de desejar
se manter e crescer. Os partidos que estão no projeto também devem se sentir
confortáveis na busca desse fortalecimento. Eu não condeno nenhum partido que
busque se consolidar, todos desejam. Eu penso que o PT, ao longo da sua
trajetória, tem evoluído na compreensão que é necessária para fazer alianças,
mas ainda tem muita dificuldade de praticar essa compreensão que afirma no
discurso. Tem dificuldade de apoiar e ser apoiado e isso é um exercício que nós
esperamos que evolua no processo eleitoral.
Tribuna: Acredita que a senadora Lídice da Mata e o PSB podem marchar longe
do PT e ainda apoiar a candidatura de Alice Portugal?
Daniel Almeida: Nós temos dialogado com muitas forças. Com PSB, com PRB,
com o próprio PR, com o PMDB, com o PV, com o PPS, com o PTB, temos conversado
também com o PT. O arco de contatos é amplo e há possibilidade, sim, de haver
uma combinação com o PSB. É até um desejo que pudéssemos ter uma combinação
maior, mas não sei que papel a Lídice está imaginando desempenhar nesse processo
eleitoral. Fala-se da hipótese dela ser candidata, tem todas as condições, toda
a legitimidade para colocar o seu nome. Eu penso que essa hipótese, inclusive,
tem potencial grande para alterar certos elementos do processo eleitoral que
está em curso, mas não tem nada acertado em conversas com o PCdoB. Se pudéssemos
ter o apoio da senadora Lídice da Mata, seria um conforto muito grande, daríamos
um (...) extraordinário.
Tribuna: Qual sua avaliação da gestão João Henrique?
Daniel Almeida: O governo João Henrique involuiu ao longo do tempo. Ele
começou com um um perfil, no primeiro mandato, representando o sentimento
oposicionista, e ao longo da trajetória involuiu para a mediocridade. Mas não dá
para corrigir, é coisa do passado, o mal está feito. A gente tem que olhar para
frente e perceber os desafios que essa cidade tem para resolver os problemas e
quais forças renovadoras podemos mobilizar para dar conta dessa tarefa de cuidar
da cidade. Não dá mais para gente repetir experiências como esta, que estamos,
felizmente, concluindo, que foi a administração desastrosa de João
Henrique.
Tribuna: A cidade está pagando um preço alto demais pelos erros do
prefeito?
Daniel Almeida: Muitíssimo elevado. Salvador tem atrasos em várias áreas,
que são muito graves e que vamos ter dificuldades, mas vamos enfrentar. A
mobilidade urbana é um deles. Grande parte da cidade vive em situação de
ilegalidade fundiária e de regularização das construções. Nós não temos uma
discussão sobre a vocação econômica de Salvador, qualificação da cidade e das
pessoas para gerar renda, a nossa orla marítima é uma coisa que dá dó. A última
intervenção foi um desastre monumental. Tiraram as barracas, que faziam parte da
nossa cultura. Não há um cidadão nessa terra que não tivesse algum vínculo com
um espaço, na praia, identificado por uma barraca. Isso foi suprimido sem que
houvesse qualquer alternativa para a urbanização da nossa orla marítima. Nós
temos muitos fracassos e nós temos, portanto, o desafio de pensar quais são os
caminhos para solucionar isso.
Tribuna: Está faltando habilidade ao governador Jaques Wagner com relação à
greve dos professores?
Daniel Almeida: Não. A greve é um direito legítimo dos trabalhadores. As
bandeiras que os professores levantam são corretas, os profissionais da educação
e a própria educação precisam ser valorizados, o governo tem limites
orçamentários que são reais e objetivos e eu penso que não conseguimos dar
atenção adequada à negociação. Não há como justificar o ambiente democrático que
estamos vivendo sem negociação. Esse é um esforço que deve ser feito. Essa
negociação começou a ser feita e houve um mês de contatos, entendimentos e
tentativas. Depois que houve a greve é que está havendo dificuldade de retomar,
de manter esse ambiente de negociação. Não acredito que seja responsabilidade do
governador ou do movimento, acho que deve haver convergência do movimento e do
governador.
Tribuna: O senhor acredita que o PCdoB pode ser culpado pela greve, por
estar no comando do sindicato que mobiliza os professores?
Daniel Almeida: De maneira nenhuma. O PCdoB tem uma posição muito clara de
apoio e reconhecimento em relação aos avanços que o governo tem alcançado,
inclusive nas demandas dos servidores, especialmente na área da educação e da
saúde, que são segmentos de grande importância. Tem buscado ajudar na
negociação, agora, o comando do movimento tem autonomia. Os líderes do movimento
podem ter opções partidárias, mas são submetidos às opções democráticas da
categoria. Lá no comando, até onde sei, tem participação de filiados do PCdoB,
do PT, que não são poucos, filiados do PSB e de outros partidos que estão no
governo ou na oposição. O comando não é composto apenas por gente da diretoria
da APLB e mesmo nessa diretoria tem filiados de outros partidos e tem pessoas
que não são filiadas a partido nenhum.
Tribuna: Está faltando bom senso para chegar a um consenso, na medida em
que os estudantes que já têm educação falha vão ser os maiores
prejudicados?
Daniel Almeida: Sem dúvida. Está na hora de voltar à mesa para
negociar.
Tribuna: A que o senhor credita a diferença de investimentos do governo
federal entre a Bahia e outros Estados do Nordeste, por exemplo?
Daniel Almeida: Eu penso que o governo federal precisa ter um plano
nacional de desenvolvimento que enxergue as diferenças regionais e sociais.
Temos evoluído nessa direção, mas o Nordeste continua sendo muito discriminado.
O BNDES arrecada da população brasileira para estimular investimentos, e o
Nordeste contribui com 14% dessa arrecadação e recebe de volta 8%. Dentro no
Nordeste existem diferenças, também, o desenvolvimento é muito desigual em
alguns nichos. Desenvolve mais uma região, mais um Estado porque nos falta
planejamento de caráter mais estratégico. Pernambuco começou a pensar o seu
desenvolvimento há mais tempo. Nós temos alguns governos, em 1982, por exemplo,
quando Miguel Arraes se elegeu e fez grandes investimentos pensando no
planejamento do Estado, que está colhendo frutos agora. Grande parte dos
investimentos de hoje foram pensados e planejados há 10 ou 12 anos. A Bahia tem
um atraso gigantesco e nós temos o desafio de acelerar esse processo. Eu não
culparia o governador Wagner pelo atraso. Acho que ele está fazendo o esforço
necessário, no tempo que é possível fazer para superar essa defasagem.
Tribuna: Mas há uma clareza muito grande, por parte da Bahia, em ficar com
menos da metade do orçamento que é destinado a Pernambuco.
Daniel Almeida: É como eu disse, Pernambuco está recebendo, agora, recursos
da refinaria e de portos que foram pensados muito antes. Se formos fazer uma
comparação daqui a 10 anos, podemos ter uma situação inversa porque nesse
governo atual, alguns dos investimentos que estavam represados começam a receber
recursos. Decorre de um atraso que vem lá de trás.
Tribuna: A que o senhor credita a dificuldade do governo Wagner em dar
ritmo célere às intervenções no Estado?
Daniel Almeida: É questão de gestão. Não sei se seria possível ter maior
celeridade. Têm entraves burocráticos que, às vezes, não dependem do governo. A
Fiol, por exemplo, que é o maior investimento e que tem o maior potencial de
impactar a vida econômica da Bahia, talvez das últimas décadas, não tem o ritmo
que é preciso ter em função de impedimentos burocráticos. Há muita resistência
em relação a isso, ao problema ambiental, problemas jurídicos, também. O
governador e o governo federal têm feito um esforço muito grande, mas
infelizmente nós temos encontrado essas dificuldades. O Brasil ficou muito tempo
sem crescer, sem fazer grandes investimentos em infraestrutura e desaprendeu.
Colaboraram: Fernanda Chagas e João Arthur Matos.
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